Crónica de hoje da Leonor Pinhão.
Uma faena com orelha e rabo nas queixas andruptas.
Mas penaltys para quê se o que está a dar agora são os pontapés-de-canto?
A discussão anda grossa e justifica-se que ande assim, grossa, porque o caso não é para menos.
O país, não sendo grande em tamanho, é e sempre foi grande em cometimentos.
Foi-se o Império, foi-se a autonomia, o futebol agora é tudo para nós em termos de cometimentos.
O senhor Fernando Pessoa, empregado do comércio na cidade de Lisboa, escreveu há 100 anos isto:
Pertenço a um género de portugueses
Que depois de estar a Índia descoberta
Ficaram sem trabalho. A morte é certa.
Tenho pensado nisto muitas vezes.
Tem toda a razão. Depois de estar a Índia descoberta e chegados onde chegámos se não fosse o futebol isto era uma enorme pasmaceira.
O futebol fornece-nos os heróis que nos faltam noutros ramos e dá-nos trabalho, dá-nos imenso trabalho a todos, embora mais a uns do que a outros como, inevitavelmente, acaba sempre por acontecer.
O futebol paira sobre tudo e sobre todos, condiciona as agendas políticas, entra e sai na Assembleia com o à-vontade de um velho compincha, suspende cerimónias de Estado, é tema omnipresente de debates jornalísticos, filosóficos e empresariais.
O futebol é rei na república.
E um rei totalitário não por culpa própria, trata-se na sua génese de um jogo que nasceu pobre e democrático, mas porque sendo tão amado e seguido pelo povo logo se aproveitam os maiorais da sua generosidade para dele abusarem à tripa-forra quando lhes é conveniente. Ou seja, sempre.
Creio, sinceramente, não estar a exagerar.
Episódios recentes vieram dar razão aos que, gostando de futebol, entendem que este absolutismo está a passar das marcas do minimamente razoável com grandes prejuízos para o progresso do país.
E neste instante peço-vos colaboração, caros leitores.
Digam-me, com sinceridade, entre estes quatro acontecimentos da semana passada, qual deles consideram o mais benévolo e o mais chocante para o país, o mais inócuo e o mais pernicioso para a república, o mais merecedor das atenções públicas, dos renhidos debates entre os nossos cérebros nativos, das primeiras páginas dos jornais e o mais prosaico de todos eles:
1 – Eusébio vai para o Panteão.
2 – Vítor Gaspar vai para o FMI.
3 – José Luís Arnaut vai para a Goldman Sachs.
4 – Álvaro Santos Pereira vai para a OCDE.
Sobre este capítulo, estamos portanto elucidados.
Sendo por estatuto e por definição um jogo, o futebol é, entre muitas outras coisas, uma questão de sorte. Ora no último Benfica-FC Porto nenhuma das equipas se pode ufanar de ter tido do seu lado a sorte do jogo.
O Benfica não teve sorte nenhuma porque viu Markovic e Rodrigo falharem os respectivos remates quando se encontravam sozinhos diante de Helton, o que poderia ter dado outra expressão ao resultado, sem que isso significasse, no entanto, qualquer coisa mais de substância do que os 3 pontos conquistados ao rival quando ainda falta metade do caminho para o fim.
O FC Porto não teve a mais pequena pontinha de sorte porque o árbitro do jogo, um sabichão habilidoso, um fanático benfiquista, célebre por atirar com as meias para a última fila do Terceiro Anel sempre que visita o Estádio da Luz, decidiu prejudicá-lo em grande e à francesa.
Como?
Ao transformar, por exemplo, uma grande penalidade inócua contra o FC Porto num pontapé-de-canto letal que resultaria no segundo golo do Benfica, o que, praticamente, sentenciou o jogo.
Para disfarçar o seu tão acalorado benfiquismo, o árbitro não marcou grande penalidade quando Mangala, num perfeito bloqueio de voleibol, obstou a que a bola cabeceada por Matic se encaminhasse com sucesso para o fundo das redes do Helton.
Podia ter expulsado Mangala, que já tinha um cartão amarelo, e não o fez por manha e amor-próprio. Assim evitou que se passasse a semana a acusar mais um árbitro benfiquista de fazer o frete ao clube do coração.
Por disfarce, o árbitro usou neste lance entre Matic e Mangala de critério largo na decisão. E assim, prejudicou fortemente o FC Porto visto que Lima, certamente encarregado de converter o castigo, não menos certamente que falharia o pontapé tal a camada de nervos que tinha em cima por estar tanta gente a olhar para ele.
Entre o eventual quase-golo da cabeçada de Matic, entre o eventual quase-golo do penalty, o árbitro, chamado a decidir, optou pelo golo certo do “corner”.
E eis como um penalty que não valia nada se transformou num pontapé-de-canto mortal. Uma vergonha, há que admiti-lo.
Os benfiquistas gostaram, evidentemente. Eu própria, confesso-o sem pudor, quando vi o árbitro mandar seguir para canto e confiante a 100% de que Garay iria marcar golo, disse baixinho, muito baixinho, para os meus botões:
- Eh lá, este tipo, no que diz respeito ao benfiquismo, é muito melhor do que o Pedro Proença!
É que na temporada passada, no FC Porto-Rio Ave a contar para a Liga, também para disfarçar o seu benfiquismo congénito, o mesmo árbitro que usou de critério largo no domingo à tarde na área portista, usou de critério apertado num lance na área vila-condense e nem hesitou em apontar para a marca do castigo máximo em beneficio dos donos da casa quando um defensor visitante viu a bola embater-lhe na mão.
Foi também por maldade que o árbitro se decidiu pelo penalty contra o Rio Ave. Fê-lo, consciente ou inconscientemente, para lavar a má-fama dos árbitros benfiquistas quando apitam no Dragão.
Foi também por perversidade lampiona que o árbitro, já na segunda parte do jogo de domingo, interrompeu a meio campo uma jogada em velocidade do FC Porto – e logo a única jogada em velocidade do FC Porto em toda a partida – para exibir todo prazenteiro um cartão amarelo a Matic.
Foi a vingança do árbitro que, na manhã do jogo, tendo lido nos escaparates que o sérvio tinha protagonizado uma chantagem genial, recusando-se a ir para estágio e a jogar contra o FC Porto, entendeu por bem castigá-lo, assim que vislumbrasse oportunidade, em nome da afronta feita a Cosme Damião, a Eusébio, a Chalana, a Toni, a Simões, a Humberto Coelho, enfim, a todos nós.
- Ah, queres ir para o Chelsea, Matic, meu sacripanta? Então toma lá este cartão amarelo e não digas que vais da minha parte!
Uma das situações pró-Benfica mais escandalosas e menos dissecadas ocorreu bem no finzinho da primeira parte e teve como intuito desmoralizar Jackson Martínez para o resto do jogo. E conseguiu o árbitro mais essa proeza de lesa-dragão.
Imagine-se só que tendo a certeza de que o colombiano falharia o golo certo na cara de Oblak, o árbitro e o seu fiscal-de-linha, outro que tal, piscaram os olhos e decidiram não assinalar a gritante posição irregular do pobre Jackson só para o avançado do FC Porto ir para a cabina, ao intervalo, profundamente amargurado com o insucesso da sua acção.
E quando os jogadores do FC Porto, em duas ocasiões na área do Benfica – as únicas duas vezes que lá foram – optaram por se atirar para o chão porque mais não conseguiam, o árbitro, coitado, com os miolos ralados, já não teve iluminação suficiente para compensar todos os desvarios por si cometidos e apontar, pelo menos, duas grandes penalidades a favor dos visitantes.
- Para quê? – disse ele aos seus assistentes no fim do jogo. – Penaltys para quê se o que está a dar agora são os pontapés-de-canto?!
Ficou esgotado o árbitro com tanta decisão favorável aos donos da casa.
Compensar? Compensar, compensar, kompensan. Foi isto, mais ou menos, o que se passou.
Foi bonita a homenagem a Eusébio que antecedeu o Benfica-FC Porto. Aliás, o respeitinho é sempre muito bonito.
O Benfica chega ao fim da primeira volta isolado no comando do campeonato, situação inverosímil de se imaginar no arranque da temporada quando o Benfica se viu cedo a 5 pontos de distância do FC Porto.
Inverosímil por inverosímil, faço votos para que o Benfica continue a lutar pelo título ainda que se prepare para ver partir neste mês de Janeiro os seus melhores e mais influentes jogadores, tal como vem sendo notícia na imprensa.
É uma pena.
A nossa Leonor, nunca falha! Excelente resposta, mesmo abusando um pouco do sarcasmo, aqui e ali...mas já se sabe que a única linguagem que os tripeiros entendem, é a fina ironia.
ResponderEliminarQuem nem isso entende, é o poeta da 1:54, ou então nem leu...
"O futebol fornece-nos os heróis que nos faltam noutros ramos e dá-nos trabalho, dá-nos imenso trabalho a todos, embora mais a uns do que a outros como, inevitavelmente, acaba sempre por acontecer."
Se vive do futebol, faz ela muito bem e não o esconde.
Incrível como estamos em 1º. depois de levarmos 5 pontos de atraso,,,(não eram eles que diziam que era impossível perderam 5 pontos de avanço?)
O mau é lembrar que se pelo menos tivessemos ganho todos os jogos em casa, estávamos com 6/7 pontos de avanço! Otários...
E sim, o respeitinho é muito bonito.
SLB
Mário
Esse poeta já foi para a ETAR que cheirava a pocilga
Eliminare a agressao do jackson ao maxi ? ninguem fala porque ? aquilo e normal ? enfim ...
ResponderEliminarO capela é que abafou a cena do Jackson.
ResponderEliminarSe fosse ao contrário até se juntava à festa,não há sumaríssimo ou desta vez não conta?
Mas vocês não sabem que a culpa foi do Maxi?
ResponderEliminarPois é, vem nas regras do futebol tuga, segundo Miguel Guedes por exemplo. Que se um jogador do clube corrupto for alvo de uma entrada mas dura esse mesmo jogador tem o direito de esmurrar o adversário que teve a ousadia de tal acto.
Ora tendo o Maxi chutado a bola e erguendo o pé a altura das costas do "queixudo", mesmo sem lhe tocar, o queixo de ferro pode fazer o que fez. Penso eu que...