Crónica de hoje da Leonor Pinhão
As grandes fugas são a deslizar
1. Correndo, e com muito gosto, o risco de uma deficiente interpretação por parte do público em geral venho afirmar perentoriamente que este Benfica de 2014/2015 tem estrelinha de campeão.
E faço questão de o repetir. Tem estrelinha de campeão, tem.
Se tem estofo ou não, veremos mais tarde. Mas estrelinha tem.
É que, exceção feita ao Benfica propriamente dito, correu tudo maravilhosamente bem para os interesses do Benfica no último fim-de-semana.
Veja-se, por exemplo, o que se passou de extraordinariamente benfazejo para as nossas cores entre as seis da tarde e as dez e picos da noite no sábado passado.
Calhou até ao Benfica ter a sorte do jogo em Vila do Conde onde, antes ainda da meia hora, já ganhava por 1-0 e tinha visto Marcelo e Hassan, dois dos mais influentes jogadores da casa, a sair de maca do relvado depois de terem caírem redondos no chão sem que ninguém lhes tocasse.
Foi o Benfica a Vila do Conde, é verdade, desprovido do seu mais influente jogador, Nicolas Gaitán, mas não demorou muito o Rio Ave, em desvantagem no marcador, a ver-se privado dos seus esteios da defesa e do ataque como que por artes mágicas.
E que equipa de futebol no seu perfeito juízo não se aproveitaria de uma benesse destas?
A nossa, precisamente.
E, no entanto, no jogo que se seguiu no Funchal continuaram as coisas a correr com muita felicidade para o lado do Benfica.
O Porto, que era suposto ganhar, acabou empatado e com uma gritante carrada de nervos em cima porque, nestes transe, quem dá a última barraca fica mais exposto à crítica. Já para não mencionar a frustração suplementar que daí advém.
Isto é ou não é ter estrelinha de campeão?
Perguntar-me-ão e com toda a propriedade:
- Mas se correu tudo assim tão bem para o Benfica em Vila do Conde e na Região Autónoma da Madeira, por que bula papal é que veio o Benfica a perder o jogo com o Rio Ave?
O que correu mal afinal ao Benfica?
A explicação é simples.
Ser-vos-á comunicada no ponto 5 deste artigo.
Agora preciso de desanuviar com temas ligeiros.
2. A UEFA recomendou vivamente às oito equipas em prova na Liga dos Campeões que evitem pressionar os árbitros nos jogos que se avizinham.
E tão vivamente recomendou a UEFA, pela voz de Pierluigi Collina que é a autoridade na matéria, que chegou ao ponto de ameaçar com sanções os emblemas prevaricadores. Posto isto, quase de certeza que a Europa não vai ouvir o Lopetegui a falar latim.
O espanhol é atrevido mas só de Badajoz para a esquerda (isto se tivermos à frente o mapa).
De Badajoz para a direita, na Europa, não se atreve.
3. A evidência da semana a intrometer-se sem pedir licença:
- Mas não há “Manel” que faça de Gaitán?
- Não. Não há.
4. De volta a assuntos fúteis:
Entre os três assumidos candidatos ao título apenas o Sporting ganhou no último fim-de-semana. Foi uma festa, naturalmente.
Não só porque os rivais não ganharam como também porque, mais do que uma bela vitória em Alvalade, tratou-se de uma goleada por 4-1 sobre o adversário que, na primeira volta do campeonato, tinha imposto ao Sporting uma derrota por 3-0. No entanto, se no lugar de contarem para o campeonato estes dois jogos entre o Sporting e o Vitória de Guimarães contassem, por exemplo, para uma meia-final da Taça de Portugal o resultado prático seria a eliminação do Sporting e a consequente qualificação do Vitória de Guimarães graças ao golo “fora” de Kanu aos 83 minutos de jogo.
Utilizando despudoradamente a imaginação uma pessoa pode sempre pairar acima, muito acima, dos estrondosos sucessos dos rivais.
5. O que correu mal ao Benfica em Vila do Conde foi o facto de o propriamente dito Benfica não ter corrido rigorosamente nada ao longo de 90 minutos de jogo contando com os 5 minutos do tempo de compensação.
Nos primeiros 5 minutos do jogo o Benfica ainda correu uma vez e logo marcou. Salvio correu, Pizzi lançou-lhe de longe uma bola em perfeitas condições e, sem parar de correr Salvio enganou o guarda-redes adversário fazendo o golo.
Foi uma grande alegria no campo e nas bancadas. Depois disto o Benfica parou. Na época passada o Benfica até tinha equipa para “parar” o jogo sempre que lhe apetecesse, trocando a bola entre os seus elementos até ao desgaste total do adversário e para nosso enorme deleite.
Mas metade dessa equipa partiu e, actualmente, o Benfica não se pode dar ao luxo de gerir resultados tangenciais só à base de intelecto. Esta é uma temporada trabalhosa em que o Benfica se perde velocidade, perde o jogo.
Estas coisas do futebol só podem correr mal a quem não corre e a quem, aparentemente, confia de modo excessivo na tal estrelinha de campeão que tão generosamente brilharia na Pérola do Atlântico duas horas mais tarde.
Sobre o pormenor de Gaitán não ter jogado nem em Paços de Ferreira nem em Vila do Conde conhecendo-se os resultados, recomendo que voltem ao ponto 3 deste artigo.
Se, pelo contrário, vos continua a interessar o tema já estafado das correrias e da ausência delas, recomendo o ponto 8 deste artigo.
Talvez possa contribuir modestamente para a clarificação destes assuntos tão aborrecidos de que me pretendo distrair regressando, rapidamente, a tópicos ligeiros de cariz filosófico e internacional.
6. O Arsenal de Londres foi eliminado pelo Mónaco e o treinador do Arsenal veio clamar pelo fim da regra de desempate através do número de golos marcados “fora”. Arsène Wenger apelou à UEFA para pôr cobro a “essa regra obsoleta” de que o próprio foi vítima na semana passada.
Obsoleto estará o Wenger, com o devido respeito. A invenção desta eficientíssima regra de desempate premiando a ousadia em circunstâncias adversas veio conferir um imenso interesse às provas com eliminatórias.
Para além de o momento da sua cognição plena marcar a passagem do estado intelectual de adepto infantil para o estado intelectual do adepto adulto. Dá-se, normalmente, entre os 9 e os 11 anos de idade.
- O Fulaninho já percebeu aquilo do golo fora valer a dobrar.
- Está um homem feito.
É sempre, sempre uma alegria para a família.
Ou seja, o adepto passa directamente da infância à idade adulta sem passar sequer pela adolescência graças a esta maravilhosa regra toda ela em prol da inteligência.
É também por coisas destas que o futebol arrasta multidões e é disto que o Arsène Wenger quer dar cabo.
7. O Benfica deslizou em Vila do Conde, é verdade que deslizou ao comprido.
Confio, não obstante, com firmeza na ginástica e na literatura para a revalidação do título. Em primeiro lugar porque vai ser precisa muita ginástica para se lá chegar depois destes últimos deslizes e em segundo lugar porque Victor Hugo escreveu numa página de “Os Miseráveis” que “as grandes fugas são a deslizar”.
Frase que sempre me foi enigmática e de que só atingi pleno o alcance depois dos acontecimentos recentes de Paços de Ferreira e de Vila do Conde.
A realidade é que já deslizámos o que havia para deslizar. Agora só falta mesmo é fugir. Para a frente, evidentemente.
8. Correm os adeptos do Benfica às centenas, aos milhares de quilómetros por estradas e caminhos e eles sempre a correr atrás de um objetivo, correm o país todo, correm para as bilheteiras, almoçam a correr, pagam tudo do bolso (e não é pouco) e o mínimo que esperam, em retribuição disto tudo, é que a equipa corra não tanto quanto eles, porque isso é impossível, mas que corra o suficiente para fazer valer esta correria louca de milhares atrás de uns poucos.
Quanto a ter ou não ter estofo de campeão, os adeptos têm.
9. É pura superstição, reconheço-o envergonhadamente, mas ninguém me consegue fazer desacreditar que, por si só, a presença do avançado Jonathan Rodriguez no “banco” seria uma poderosa motivação para o onze em campo, nomeadamente para os titulares das linhas média e ofensiva da equipa eleita pelo treinador. E não me refiro à equipa B.
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